Lígia Formenti, O Estado de S. Paulo
31 Janeiro 2019 | 21h50
BRASÍLIA – Ameaçado de perder o certificado de eliminação do sarampo por causa do retorno da doença no ano passado, o Brasil se vê agora às voltas com outro risco: o de enfrentar o crescimento de casos de difteria sem que haja tratamentos disponíveis.
Nos estoques do Ministério da Saúde, há apenas 12 tratamentos para serem usados em casos graves. Essa quantidade pode atender um número um pouco maior de pessoas – desde que o quadro esteja em um estágio menos avançado. Mas a própria pasta admite que o número é baixo e, em janeiro, solicitou à Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) 200 tratamentos para tratar a difteria. Sem isso, o paciente pode morrer.
A queda da cobertura vacinal contra difteria vem sendo registrada nos últimos quatro anos. Dados preliminares de 2018 mostram que apenas um Estado, o Ceará, apresentou uma cobertura vacinal aceitável, acima de 90%.
A situação, por si só, já seria preocupante. Mas o cenário se agrava de forma expressiva quando se leva em consideração que países próximos enfrentam surtos da infecção. Com aumento de casos da doença desde 2016, a Venezuela registrou ano passado 1.102 suspeitas. Este ano, já foram registradas 46. Também em 2018, foram confirmados 264 no Haiti e 6 na Colômbia.
Ao mesmo tempo em que aumenta o número de pessoas doentes nas Américas, a cobertura na Região Norte, porta de entrada para boa parte dos migrantes, é considerada muito baixa. Em Roraima, a taxa de imunização está em 66%. No Acre, é de 60% e no Amazonas, de 77%. O Amapá tem 55% e Rondônia, Estado com melhor desempenho da região, tem 85%. O Pará, com o pior desempenho, tem cobertura de 49%.
A difteria é uma infecção causada por bactéria, transmitida pela tosse, pelo espirro ou pelo contato com objetos ou roupas contaminadas. Os sintomas da infecção surgem entre dois e cinco dias depois da exposição. Geralmente isso ocorre de forma gradual, com uma simples dor de garganta. “Com a progressão da doença, a bactéria passa a produzir uma toxina, que pode provocar bloqueio das vias aéreas, inflamação dos nervos e do miocárdio”, explica o pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz, Cláudio Maierovitch.
As vacinas disponíveis protegem justamente contra a ação da toxina. O soro usado no tratamento da toxina é preparado a partir de anticorpos coletados de cavalos. A redução dos estoques é fruto de problemas no potencial de proteção do soro, menor do que o padronizado, identificado há alguns anos.
“Quando as dificuldades foram identificadas, a solução foi centralizar o fornecimento do soro”, conta Maierovitch, que já ocupou o cargo de diretor do Departamento de Vigilância de Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde. Doze tratamentos pode parecer um número suficiente para estoques quando se analisa o histórico mais recente de casos da doença. Em 2015, foram 16. No ano seguinte, foram 4 e em 2017, 5. “Mas diante dos casos em outros países e da cobertura vacinal em queda, o risco aumenta”, afirma o pesquisador.
Maierovitch acha difícil que o Brasil tenha um surto de difteria nas mesmas proporções que a Venezuela ou o Haiti. “Há aqui um bom sistema de vigilância, capaz de identificar os casos e fazer bloqueio, por meio do uso de antibióticos”, diz. Mesmo assim, o pesquisador da Fiocruz enfatiza a necessidade de se tomar medidas de prevenção. Reforçar estratégias para aumentar a cobertura vacinal, buscando pessoas ainda não vacinadas, indo a campo, sobretudo em áreas consideradas mais suscetíveis.
O fato de Estados do Norte enfrentarem uma redução na assistência, reflexo das mudanças no Mais Médicos, pode ser um complicador, afirma Maierovitch. “O tratamento da difteria dá trabalho, a vigilância, o bloqueio. As áreas onde há falta de profissionais são mais vulneráveis, mas, pelo fato de estarem mais distantes, podem estar menos expostas à bactéria. Mas se der azar de chegar justamente por esses pontos, aí teremos um problemão.”
Na semana passada, a Opas emitiu um comunicado alertando para a necessidade de viajantes que se dirigem a países onde há surto de difteria se vacinarem. A recomendação também é feita para profissionais de saúde. No alerta, a Opas recomenda ainda suprimento de antitoxina diftérica e o fortalecimento dos sistemas de vigilância.
O Ministério da Saúde alerta para a necessidade de que pessoas atualizem a carteira vacinal. A imunização tem de ser renovada periodicamente.
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