Um estudo publicado nesta quarta (28) mostra que é possível que infecções anteriores pelo vírus da dengue piorem a gravidade da microcefalia gerada pelo vírus da zika. Os experimentos foram feitos em camundongos os resultados são mais uma peça no quebra cabeça que intriga cientistas desde 2015, quando o surto teve início no Brasil.
Os vírus da família dos flavivírus (como dengue, zika e febre amarela) apresentam neurotropismo, ou seja, têm uma preferência natural em infectar e se reproduzir em células do sistema nervoso, mas só o vírus da zika sabidamente causa microcefalia.
Nos experimentos, em camundongos fêmeas infectadas apenas com vírus da zika também houve redução no tamanho da cabeça, mas naqueles que já tinham anticorpos contra o vírus da zika a má-formação foi acentuada.
Uma explicação possível para o fenômeno é a atividade da proteína FcRN, responsável por transferir anticorpos da mãe para os fetos.
No organismo dos fetos, os anticorpos antidengue, ao se ligarem de maneira inefetiva às partículas virais de zika, aumentariam o poder de infecção delas, ampliando o efeito e minimizando as chances de o organismo combatê-las.
A importância desse fenômeno, conhecido como potencialização dependente de anticorpos (ou ADE, na sigla em inglês), para explicar o grande número de casos de bebês com microcefalia e outras más-formações, especialmente no Nordeste, ainda é motivo de debate entre cientistas.
Recentemente um estudo epidemiológico em humanos apontou justamente o oposto do observado nesse novo estudo em animais, ou seja, que a imunidade para dengue poderia ajudar a prevenir casos graves decorrentes de infecção do vírus da zika.
O virologista Maurício Lacerda Nogueira, da Faculdade de Medicina de Rio Preto, foi um dos coordenadores do estudo com humanos, feito com 1.500 moradores de um bairro de Salvador. Segundo ele não dá para dizer que esse seja o mecanismo que explique a presença do surto de microcefalia no Nordeste. Se a explicação fosse apenas a infecção prévia por dengue, restaria ainda explicar as baixas taxas de casos de microcefalia nas regiões de Ribeirão Preto (interior de São Paulo), de Manaus e na Colômbia, por exemplo.
“Não bate com as evidências epidemiológicas que temos. Eu ainda não compro essa explicação”, afirma Nogueira.
Segundo os autores do novo estudo, que saiu na Science Advances, ainda falta compreender os mecanismos envolvidos no transporte de anticorpos da mãe para o feto em humano. Na nossa espécie, que tem uma gestação muito mais longa que a de camundongos (38 versus 3 semanas), alguns momentos do desenvolvimento parecem ser mais sensíveis do que outros.
No fim das contas ainda há questões a serem resolvidas enquanto o fantasma das arboviroses continua a nos assombrar.
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