A falta de recursos humanos acaba gerando lentidão nos processos analisados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), afirma Meiruze Sousa Freitas, diretora da agência. “Impacta nos trabalhos da agência, especialmente nos tempos de decisão dos processos, bem como nos tempos de atualização do marco regulatório. Então, temos um impacto muito grande em termos da eficiência no Brasil, considerando essa redução dos recursos humanos da agência”, avalia.
Segundo ela, a modernização pelo qual passou a indústria farmacêutica nacional e a decisão do governo de fazer um programa de industrialização exigem que o papel da Anvisa seja repensando. “Se o Brasil não repensar qual é o papel da Anvisa do ponto de vista do mercado e do favorecimento do acesso, e por outro lado da própria estratégia da neo-industrialização, não conseguiremos dar as respostas que o País precisa, especialmente do setor farmacêutico, que investe em inovação e amplia cada vez mais sua capacidade produtiva”.
A seguir a primeira parte da entrevista concedida ao Grupo FarmaBrasil (GFB).
O governo não realiza concurso para a Anvisa desde 2016 e a agência possui hoje um déficit de cerca de 1.146 pessoas. As 50 vagas do concurso anunciado em janeiro são suficientes?
Estamos com problema sério de déficit de recursos humanos na agência. É notório e colocamos isso em diversas oportunidades e de forma pública. É um tema recorrente na pauta da Anvisa, que foi criada em 1999. De lá para cá, a agência cresceu muito do ponto de vista da importância para a sociedade em geral, mas também do ponto de vista do impacto econômico da agência, visto que o mercado cresceu bastante. Primeiramente, a agência foi criada com a previsão inicial de 1.100/1.200 servidores no seu quadro de servidores de carreira (primeiro concurso foi em 2005). Quando a agência iniciou suas atividades, em 1999, contou com servidores de vários órgãos públicos em um primeiro momento, até se somarem ao grupo os concursados. Em 2007, nos encontramos com o melhor quantitativo de servidores, cerca de 2,7 mil. Tivemos um segundo concurso em 2013 também. De lá para cá, muitos aposentaram, outros tantos deixaram a agência, agravando o déficit de servidores. Hoje, o total de servidores é apenas cerca de 1500, muito inferior à quantidade necessária para a Anvisa ter a performance de prazos equivalente à de autoridades reguladoras de países que promovem a inovação e buscam maior resiliência do setor de saúde nacional. As 50 vagas são muito importantes, mas eu diria que precisamos de mudanças de marcos legais, de mudanças de lei sobre a quantidade de servidores que a agência precisa ter para que possamos estar alinhados não apenas com as políticas públicas, mas até mesmo com o que o mercado exige.
Essa falta de recursos humanos impacta as atividades da agência?
Impacta nos trabalhos da agência, especialmente na vazão em que os processos submetidos à Anvisa são analisados, bem como na velocidade com que o marco regulatório é modernizado. Então, temos um impacto muito grande em termos da eficiência no Brasil, considerando essa redução dos recursos humanos da agência. Importante destacar que ao longo desse tempo a Anvisa fez aprimoramento de processos, aprimoramento de regulação, olhando onde é possível racionalizar e simplificar. O setor brasileiro amadureceu de forma geral, especialmente o de medicamentos que, talvez, seja o mais maduro dos mercados que nós regulamos. Desde o ponto de vista da modernização das fábricas, mas também por ter colocado a estratégia regulatória como estratégia também de ampliação do mercado e melhoria dos produtos que eles ofertam à sociedade. Ao longo desse tempo, a Anvisa também foi se modernizando baseado na confiança regulatória, do setor que amadureceu junto. É um setor que, em termos de qualidade de produção, está sustentado entre os mercados mais regulados do mundo e isso impacta diretamente no acesso, na nossa capacidade, porque à medida que esse setor cresce, também exige mais da Anvisa, especialmente no tempo de resposta. É muito interessante observar que o setor regulado pela Agência não pede que a Anvisa reduza regras, ou diminua o nível de proteção considerado adequado pela Agência, para que acelere o seu tempo de resposta frente às submissões que recebe. As regras da Anvisa também são estratégicas para uma competitividade mais justa e equilibrada. Agora, se o Brasil não repensar qual é o papel da Anvisa do ponto de vista do mercado e do favorecimento do acesso, e por outro lado da própria estratégia da neo-industrialização, não conseguiremos dar as respostas de que o País precisa, especialmente do setor farmacêutico, que investe em inovação e amplia cada vez mais sua capacidade produtiva, porque os nossos tempos de resposta serão o principal problema hoje enfrentado pelos setor regulado pela Agência, e prejudica também a população na medida em que retarda o acesso a medicamentos que atenderiam a necessidades médicas atuais.
Além do pedido de concurso público, existe mais alguma medida em andamento para melhorar os tempos de análise e resposta da Agência?
O setor farmacêutico brasileiro hoje é além fronteiras, tem favorecido uma melhora na nossa balança comercial e tem se aventurado em outros mercados, inclusive com a abertura de fábricas em outros países. O pior dos mundos para nós é o produto brasileiro ser registrado fora do Brasil, mais rápido que os tempos impostos hoje à Agência devido a recursos humanos insuficientes. Mas ressalto que, claramente, temos estratégias de melhorias já implementadas. E a própria estratégia de confiança regulatória adotada ativamente pela Agência nos anos mais recentes é positiva, pois não abrimos mão da soberania nas tomadas de decisão do Brasil, das características necessárias dos produtos que circulam por aqui. A confiança regulatória é uma estratégia que tanto se beneficia de avaliações feitas por reguladores estrangeiros com avaliações regulatórias equivalentes às da Anvisa, evitando, portanto, a duplicação de esforços, como também o reconhecimento da consistência da gestão da qualidade das empresas farmacêuticas nacionais ao longo dos anos, qualificando-as a se beneficiarem de avaliações otimizadas e mais céleres por parte da Anvisa. Hoje, o Brasil precisa repensar a estratégia regulatória que nós teremos e qual a capacidade de respostas para os próximos anos, nos tempos de prazos legais. Para isso, não adianta uma recomposição que pense só naquela agência criada em 1999, queremos uma recomposição que pense no mercado atual e na pujança do mercado nos próximos anos, especialmente quando estamos falando em inovação e novas tecnologias. Hoje somos reconhecidos no mundo pelo trabalho desenvolvido até aqui, mas precisamos avançar.
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